segunda-feira, 13 de agosto de 2012

"Todo roubo e toda a indiferença"

Semana passada foi-se embora um cordão de ouro com um coração que ganhei de paps quando fiz quize anos.
Coisa que eu gosto (ou gostava, ainda não sei) é andar na rua.
Sentir o vento, ver as pessoas, as árvores, os passarinhos, ver a vida acontecer. Na rua a gente sente a vibe do mundo, qualquer que seja ele. A gente é livre quando caminha. Imprime ao caminho nosso ritmo, vê com os olhos que te habitam naquela hora, escuta os ruídos, as gentes, presencia os movimentos à nossa maneira. Quando caminhamos pela rua estamos no mundo, não no nosso, mas no mundo que está aí pra nós, com suas mudanças ou suas permanências. Enfim, adoro caminhar. É o momento em que mais reflito sobre o que for que estiver me apoquentando, e, consequentemente, também elaboro perguntas e respostas.
Lindo, até então.
Nunca tinha sido roubada. Uma vez tive a mochila da Company roubada, por tê-la deixado no chão do Fiat 147 que mamãe tinha. Fiquei muito triste, mas não vi a cara do ladrão, tive essa sorte.
Mas dessa vez, o roubo foi cara a cara.
Uma voz na minha cabeça me disse (mesmo) que eu estava distraída. O vai e vem da região hospitalar me absorveu muito e também o sujeito estranho que estava à minha frente, com uma tornozeleira de presidiário (nunca tinha visto uma). As pessoas se desviavam dele, que andava a esmo, aparentemente se divertindo com as reações dos transeuntes a sua estranheza. Ele ficou prá trás, tomei o cuidado de apertar as passadas. Senti então uma mão no meu ombro. Esquisito. Não parecia ser alguém conhecido, pois era um jeito estranho de tocar no ombro. Quando me virei, vi um rosto masculino bem perto e senti seu dedo indicador na lateral do meu pescoço. Deslizou até encontrar a correntinha, que arrebentou facilmente. Com a outra mão, a aparou e colocou rapídamente no bolso da calça, se esqueirou entre mim e a banca de jornais, atravessou a rua como uma enguia por entre os carros e subiu correndo a avenida transversal, olhando pra trás.
Ele ouviu o "filhodaputa" que soltei, quando senti que aquele presente, caríssimo pra mim, se desprendeu irremediavelmente para sempre de meu pescoço. Não era o rapaz da tornozeleira. Era um rapaz comum, vestido como um jovem qualquer.
Chamei a polícia, que me atendeu no que pôde, mas que infelizmente não será capaz de reaver meu presente, quiçá meu gosto por caminhar pela rua.
No boletim de ocorrência o campo "motivação do delito" foi preenchido com a vaga explicação: "dificuldade financeira/ cobiça".
Olha, seu moço, é muito mais. Se tivéssemos um campo desse pra preenchermos com  as motivações para todos os delitos dos quais o infeliz cidadão brasileiro é vítima toda hora, todo dia, teríamos longos textos anexos.
Ao final destes, precisaríamos sempre citar o absurdo da lógica perversa de que "temos que nos adaptar e nos acostumar", porque ser desrespeitado é regra, não exceção.
Então dá licença, tô me retirando, embora o "retirar" se dê em parte apenas, pois não consigo me excluir totalmente dessa enganação injusta que é o Brasil. Se eu pudesse me retirar pra outra parte do mundo, como outrora fiz, picava a mula loguinho, pra não voltar nunca mais.
Tal qual Carlota Joaquina, batia os sapatos e não levava nem um pozinho desse solo amargo.

Título retirado da canção "Perfeição" - Legião Urbana, vale lemrar.

Um comentário:

Marcia Franco disse...

se for, me leva, por favor.