domingo, 9 de dezembro de 2012

nós e a elétrica energia

Quantas gerações já se contam desde a incorporação da energia elétrica no nosso cotidiano? 
Me peguei pensando nisso ontem, por causa do temporal que me cortou a luz por horas durante toda a noite. Todos nós aqui hoje conhecemos, superficialmente, através de relatos históricos, filmes e tals, como era a vida sem lâmpadas, fios e controles remotos. Mas desconhecemos completamente como se daria a vida de hoje sem eles. Entende o ponto? O que viraria nosso dia a dia e como iríamos nos virar sem essa parafernália.
Comecemos pelo ato de conservar alimentos refrigerando-os. Acabaria-se. Reflita que isso seria como a reinvenção da roda. Depois as telecomunicações, os entretenimentos, os transportes, os hábitos, os horários, as distâncias, a segurança, a saúde, o conforto dos banhos quentes e da refrigeração do ar. Quanto deveria ser repensado? Tudo. Maluco, né? 
O mundo como conhecemos deveria ser totalmente reestruturado se o apagão da eletricidade viesse pra ficar. E daríamos adeus à "Era da eletricidade", como demos à da Pedra Lascada.
Mas não creio que tal coisa aconteça, embora não estejamos livres de desastres pontuais.
Pra minha sorte eu tinha acabado um banho ótimo, durante o qual ouvia a uma fita (isso, fita K7, sou maluca) do Oasis, que gravei de um grande amigo em 1998. Já me enxugava quando tudo se apagou.  E além da chuva, do vento e dos trovões não ouvi mais nada. Além do breu que nos invade a visão, o silêncio, em virtude da ausência da vibração de qualquer motor, é quase uma experiência bizarra. Não que seja ruim. Acho lindo. Mas o silêncio ortodoxo é um ente de outro mundo pra nós. Porque o nosso mundo é barulhento até falar que chega. Ainda que você decida que vai ficar em silêncio, lá no fundo, no andar de baixo, na cozinha, no vizinho ao lado... vai haver um bzzzzz, ou brrrr, ou tectectec, ou nnnnnnnnnn. Não tem jeito com isso, não dá pra brincar de vaca amarela com os milhares de motores que nos mantém vivos sem que a gente nem perceba. 
Mas sempre achei lindo o silêncio e o escuro, a luz das velas nos guiando pela casa, a aura arcaica que emerge junto com a pane elétrica. Desde criança, sempre gostei desses momentos.
Eu e os cães nos recolhemos à sala, iluminada com a montoeira de velas que tenho, em pitorescos castiçais e garrafas de vinho respingadas de cera. Abri um livro - "História da Vida Privada no Brasil - Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa", meu favorito da série de 4 volumes.
E pronto, éramos só nós, os pingos de chuva no mato lá fora. Barulho nenhum mais. Horas sublimes, de reordenação dos sentidos em torno de uma nova realidade.
Exceto o barulho dentro de nós. Esse parece que nunca cessa.